A generic square placeholder image with rounded corners in a figure.

Aos 62 anos, único desertor da Coreia do Norte abertamente gay encontra o amor

Jang Yeong-jin fugiu do regime norte coreano em 1997 rastejando por um campo minado. Agora, o desertor está noivo de um estadunidense.
Jang Yeong-jin fugiu do regime norte coreano em 1997 rastejando por um campo minado. Após inúmeros desafios, o desertor está noivo de um estadunidense.

Jang Yeong-jin tinha 27 anos quando descobriu que não se sentia atraído por sua esposa. Isso, na Coreia do Norte, é um “problema”, pois lá não existe um conceito de homossexualidade. Dessa forma, Jang teve que abandonar o regime norte-coreano. Agora, 25 anos depois, ele finalmente encontrou o amor, do outro lado do mundo. 

Em entrevista à BBC News, Jang conta que tudo começou em sua noite de núpcias. “Eu não conseguia sequer encostar na minha esposa”, recorda. Seu irmão passou a desconfiar que algo estava errado quatro anos depois, porque o casal ainda não tinha filhos. Desse modo, Jang confessou ao irmão que nunca teve atração por mulheres – e foi encaminhado para um médico. 

Leia também: Dirigindo pela gentileza: donos de cafeteria elogiam desconhecidos na rua

Buscando uma “cura”

O norte-coreano lembra que foi a muitas clínicas, onde conheceu casos parecidos: homens que não gostavam de mulheres. Mas eles não podiam explorar o que sentiam. “Na Coreia do Norte, se um homem diz que não gosta de uma mulher, as pessoas pensam que ele está doente”, expõe Jang. 

Pessoas do mesmo sexo em um relacionamento podem ser até executadas pelas autoridades. Segundo desertores entrevistados por Kim Seok-hyang, professora de Estudos Norte-Coreanos em Seul, o conceito de homossexualidade não existe na ditadura do país. 

Jang queria libertar sua esposa. Tentou o divórcio, porém, na Coreia do Norte, o casamento só acaba se for uma ameaça à ideologia do país. Dessa forma, só restou a Jang fugir. Assim, ele chegou à Coreia do Sul rastejando pela zona desmilitarizada que divide os países – um campo minado, cheio de explosivos.

Desertor: uma nova vida

Em 1997, o desertor começou uma nova vida em Seul. Lá, ele descobriu que era homossexual e passou se relacionar com outros homens. No entanto, foi enganado por um parceiro em 2004 e perdeu tudo o que tinha. Se viu desempregado, sem teto e sem dinheiro.

Aos poucos, ele foi se estabelecendo novamente. E passou a escrever nas horas vagas. Assim surgiu sua autobiografia: A Mark of Red Honor – “Uma Marca de Honra Vermelha”, em português.

Escrever sua autobiografia foi a maneira que Jang encontrou de reconstruir sua história. Foto: Now Formosa.

Depois do golpe que sofreu, Jang hesitou em conhecer outros parceiros. Mas, no ano passado, ele conheceu um americano em um site de namoro. Deixou o medo de lado e viajou até os Estados Unidos para conhecê-lo.

Finalmente, o amor!

Aos 62 anos, Jang conheceu seu parceiro. Mas não foi amor à primeira vista. Pelo contrário: a primeira impressão que teve dele foi ruim. “Vendo como ele se vestia, achei que era um homem mal-educado e rude”, conta à BBC. Isso porque o americano usava bermuda e boné no saguão do aeroporto.

O noivo de Jang é oito anos mais novo que ele e é dono de um restaurante. Foto: Arquivo Pessoal/Reprodução.

Aos poucos, ele passou a conhecer melhor o futuro noivo. Por causa da pandemia, eles beberam muito vinho juntos e fizeram piqueniques. Logo, Jang se viu apaixonado e pediu o parceiro em casamento com dois meses de namoro. E ele aceitou!

O casal agora espera os documentos que provam o fim do casamento de Jang ficarem prontos. Depois, vão oficializar a união. 

“Sempre me sentia assustado, triste e solitário quando morava sozinho. Sou muito introvertido e sensível, ele é uma pessoa otimista. Fazemos bem um ao outro”, Jang Yeong-jin.

Reportagem de Isabela Stanga, sob supervisão de Ana Flavia Silva.